Pular para o conteúdo principal

Ô, glória.

Faz 1 ano e 5 meses que saí da igreja evangélica, e é a primeira vez que vou falar disso especificamente.
Pra mim, é um assunto complicado de se falar, levando pro lado pessoal, porque a minha saída foi um tanto traumática. Passei 3 anos dentro de uma igreja em que me senti muito acolhida, em um grupo que eu considerava uma segunda família. Convivia com aquelas pessoas quase metade da semana, passava quase todos os feriados com eles, enfim. Sabe aquela conversa de "irmão" na igreja? Pois é. Era como eu realmente me sentia com eles.
Por 3 anos, tentei me encaixar ali. A beleza de tudo aquilo, pra mim, era que diziam "todos somos pecadores", então, era normal eu me sentir diferente, e tantas coisas não fazerem sentido por inúmeras vezes. Por outro lado, era muito bom algumas vezes imaginar que, em algum lugar, eu teria algum conforto, porque tinha um deus que me ajudaria de alguma forma e tudo ficaria bem. Eu só precisava deixar de ser quem eu era, e abrir mão de ser feliz.
A escolha da igreja foi por ser uma igreja sóbria, sem dança, sem palmas, com pessoas acolhedoras, e um pastor que não se incomodou com as minhas inúmeras dúvidas. Logo eu quis começar a ler a bíblia, e assim fui lendo durante todo o tempo em que estive lá. Além disso, era uma igreja que tinha um estudo teológico sério e bem definido, os pastores tinham muito conhecimento não só teológico, mas filosófico, sociológico... isso tudo me fascinou, eu confesso, e eu acabei me encantando e resolvendo que ali seria a igreja ideal.
Resolvi ir pra igreja quando ganhei um livro de uma tia muito querida com o título "Como criar meninos". O livro falava que meninos precisam de um grupo de homens em quem se espelhar, pra que estes possam ter modelos de caráter, enfim. O único lugar que me veio à cabeça foi uma igreja. Tentei a igreja católica, mas não foram acolhedoras. Tentei outras evangélicas, mas me faltava entusiasmo pra fazer parte. Cheguei ali, me senti bem. Ok.
A diferença de abordagem entre chegar na igreja e me pressionarem pelo dízimo ou com o famoso "Jesus te ama!" clichê, mas uma fé racional, que me levava a refletir, me fez pensar que, sim, apesar de eu já ter passado por várias fases diferentes sobre religião anteriormente, tudo bem.
Decidi sair da igreja e me separar quase ao mesmo tempo. Eu tentei. Tentei muito, com todo o meu coração e com todas as minhas forças. Tentei me encaixar, tentei ser a mulher que a igreja dizia que eu tinha que ser. Submissa, e que viveria, antes de tudo, pra glorificar a deus, ainda que isso significasse sacrificar a minha felicidade. O problema é que, quanto mais o tempo passava, mais eu me afundava, mais infeliz eu ficava. Eu glorificava a esse deus, enquanto eu perdia a minha vida. Qual era o sentido disso tudo? Eu tava me tornando um câncer, pra mim e pros meus filhos. Desde que meu primeiro filho nasceu, eu deixei de existir como pessoa pra virar mãe. E, desde que eu entrei pra igreja, aquele papel que a igreja me impôs de esposa submissa, foi me matando aos poucos, até eu não me ver mais capaz de sequer ser mãe. Eu nunca fui submissa, não sei ser submissa, e perdi as contas de quantas vezes disse isso pras mulheres que julguei serem minhas amigas na igreja. A explicação era a mesma: "é por causa do pecado". É uma ótima explicação. Pena que isso não resolve os nossos problemas. Porque, ok, que fosse... mas, então, onde estava esse deus pra me ajudar naquilo que ele mesmo queria que eu fizesse?!
Assim, quando me separei, fui chamada pra um almoço achando que era entre amigas, por preocupação, pra dar notícias, algo do tipo. Não, não foi. E eu fui embora dali completamente destruída. Eu e mais 4 mulheres, e só uma olhou pra minha cara na hora de se despedir. Até hoje não sei com que forças eu consegui me levantar daquela mesa, dizer tchau, sair do restaurante e andar até o carro, pra, só então, desabar no choro sozinha e ligar pra uma das minhas melhores amigas.
Eu achava que era uma fé racional, mas, no final das contas, é a mesma fé cega, que julga a tudo e a todos, e que te manda pro inferno no momento em que você toma uma decisão contrária aos preceitos que eles pregam. Eu pensava que era uma igreja diferente, que respeitava as pessoas, já que se dizem humildes por acharem que a "salvação" vem exclusivamente desse deus, independente das qualidades ou defeitos de qualquer pessoa - mas, no final das contas, não. Se você não faz parte do clubinho deles, você vai ser tratado como um mero conhecido no meio da rua, ainda que antes disso você tenha convivido quase que diariamente, por 3 anos, como eu ouvi de alguém que eu considerava um grande amigo, respeitava e admirava.
Quando entrei pra essa igreja, pensei quebrar muitos preconceitos. Pensei estar conhecendo "evangélicos diferentes" daqueles que tinha visto antes. Na verdade, a maioria é mais do mesmo. 70% das pessoas que faziam questão de me abraçar quando eu chegava na igreja, hoje fingem que não me conhecem. Uma profissional que era membro da igreja e dizia me amar parou de me responder mensagens assim que eu saí da igreja. Claro, tem outras que continuam falando comigo da mesma forma, muito queridas, e por quem eu continuo nutrindo o mesmo amor e carinho. Porém, é uma minoria. O pastor que me acompanhou do momento em que eu entrei pra igreja até o momento em que eu saí - esse foi o que me virou as costas e disse que, dali em diante, me trataria como uma mera conhecida quando me encontrasse na rua. Mas, "raçuda" que sou, como diz um amigo meu, agradeço a ele, porque hoje não caio mais nessa lábia de igreja.
Sim, foi bem difícil ouvir isso, afinal, era uma pessoa que eu tinha uma consideração imensa. A sensação foi de ter levado uma facada pelas costas.
Logo em seguida, foi aniversário de um dos meus filhos, e, como ele gostava muito daquelas pessoas, achei que seria melhor convidá-los. Também foi um momento extremamente doloroso pra mim. Estar no mesmo ambiente com pessoas que, há menos de 3 meses, eu poderia jurar que eram como irmãos pra mim - porém, naquele momento, me olhavam e me cumprimentaram como se eu fosse uma conhecida qualquer, sem qualquer intimidade.
Chega a ser irônico, mas eu tenho medo de encontrá-los na rua. Eu sei que eu nunca fiz nada de mal a nenhum deles. Não fui quem os destratou ou causou qualquer trauma a eles num momento de dor na vida deles. Porém, eu sei que é uma ferida que ainda demora muito a fechar, e, por incrível que pareça, seria muito constrangedor, pra mim, cruzar com qualquer um deles, porque, muito provavelmente, isso me desencadearia uma crise de pânico.
Então, realmente... hoje em dia, me reservo no direito de não querer ouvir falar sobre igreja evangélica, ou entrar em qualquer igreja cristã.
Por que eu resolvi falar sobre isso? Porque vi esse video na minha TL, e achei interessante a postura dessa moça.
Pode ser que um dia eu mude de idéia? Acho difícil, porque hoje enxergo muitos problemas no cristianismo que não via antes, mas, "nunca diga nunca".



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Esse tal coração calejado

Pra expressar a dor, é preciso vomitá-la. Chegar ao fundo dela, rastejar. Passar pelo processo da negação, da dormência. Depois, sofrer. Sentir o nó na garganta, a dor no peito, que passa pro corpo, e vem a febre, os soluços. Aí sim. Só tem um coração calejado quem já sofreu demais. Várias vezes, ou intensamente. E talvez não exista expressão melhor pra definir do que essa.  Um coração calejado não sente com tanta facilidade. Ele é duro, aguenta porrada - é calejado. Claro, tem sempre algum machucado novo que pode foder com ele. Aí, é aquele processo de novo.  Sempre me neguei a generalizar as pessoas, a desacreditar do amor, a me amargurar. Sou otimista por natureza. Porém, com o tempo, acho que a gente fica mais cautelosa. Ou mais desiludida mesmo.  É um exercício diário o de me lembrar, constantemente que, existem sim pessoas boas, honestas, sinceras, legais, e que valem a pena.  Só estão comprometidas.   E, claro, existem uns machucados piores que os outros. Normalmente,

Carta para minha futura nora (2)

Esses dias vi circulando no facebook uma  "carta para minha futura nora" , e eu, sendo mulher, alinhada politicamente ao feminismo radical, mãe, não pude deixar de problematizar... Pensei, pensei... por fim, resolvi escrever a minha própria versão de carta para minha(os) futura(os) nora(genros). Vem cá, vamos conversar. Esqueça tudo que você já ouviu falar sobre sogras. Eu não te vejo como concorrente, e tenho plena consciência de que o tipo de relacionamento que você e meu filho tem é completamente diferente do relacionamento que eu, como mãe, tenho com ele. Nós podemos ser amigas, e, pra te falar a verdade, ficarei muito feliz se formos. Não, você não precisa se preocupar em me agradar demais pra me conquistar nem nada disso. Veja, eu não vejo meu filho como uma extensão de mim. Sim, eu o amo muito, e tenho ensinado a ele tudo aquilo que acredito ser importante pra que ele possa caminhar com os próprios pés e fazer as próprias escolhas. Como mãe, meu maior desejo é que

“Sempre em frente, não temos tempo a perder”

 Pensar no que já foi não vai te ajudar em nada. É preciso esquecer, por um tempo, um pouco do que se viveu, pra deixar partir. O luto vem, querendo ou não. Dói. Mas sempre tem um amanhã, com novas promessas de novas memórias, como se todos os dias fossem como um ano.  É preciso deixar morrer. É preciso se conter, pra não ter por insistência o que já não era pra ser. É preciso força, coragem, resiliência. É preciso entender que sonhos e promessas só são verdadeiros no momento em que são idealizados, e as coisas mudam antes de um piscar de olhos. E, não, não há nada que se possa fazer pra impedir.  É preciso aceitar morrer. Aceitar não ser(mais). Aceitar perder e ser perdida.  É preciso acreditar que, eventualmente, as lágrimas secam e o sol nasce outra vez, com novas cores, sabores, amores.