Há algum tempo, venho refletindo e percebendo uma coisa um tanto perturbadora, mas muito real.
Todas as violências que sofri por ser mulher foram legitimadas por praticamente todos que conheço(independente do grau), quando não foi por todas.
Existem várias formas de legitimar uma violência - negação, vista grossa, justificativas, mascarar, banalizar e, até mesmo, naturalizar. Eu acredito que um misto de todas é algo bem familiar pra mim.
Nem sempre percebemos de cara uma agressão, uma violência. É tudo tão ignorado pela sociedade de uma forma geral, que falarmos sobre isso parece uma grande afronta, além de ser um assunto intocável e incômodo.
A sociedade é machista, patriarcal e odeia crianças. Crianças são tratadas como brinquedo/objeto por uma parcela grande da sociedade. Crianças não sentem, não pensam, não opinam, não entendem. Porém, quando convém, são a melhor arma pra atacar as mães. Afinal, um filho é obrigação da mãe - quando a figura do pai aparece, é como um coadjuvante especial, que merece ser exaltado sempre.
É tão comum a prática de se jogar problemas "delicados" pra debaixo do tapete, que ousar levantá-lo e mostrar a sujeira - ainda que seja uma parte - é uma ofensa geral. Não é à toa que feministas são "personas non gratas" em qualquer espaço coletivo, desde o menor e mais íntimo, até o que se divide com a sociedade em geral.
Particularmente, percebo como inevitável que, algum dia, eu me reconheceria feminista. De alguma forma, somos e seremos sempre culpabilizadas por cada coisa que sofrermos. E essa cobrança começa cedo pra qualquer menina, muito diferente do que acontece com pessoas do sexo masculino. Esses, sempre terão segundas e terceiras chances. A nós, não. Precisamos calcular bem cada passo, porque se nasceu com buceta, logo se aprende o conceito de "dois pesos, duas medidas". Nós não temos o direito de errar, questionar, discordar. Tomar decisões nos priorizando ou até mesmo se expressar de forma independente do pensamento alheio é motivo dos mais misóginos xingamentos.
Perdi as contas de quantas vezes fui chamada de "sem vergonha" por falar o que penso, me priorizar ou até mesmo questionar. Percebam que não houve qualquer conduta sexual ou algo do tipo(o que, ainda assim, não justificaria). Porém, é sempre uma grande afronta quando uma mulher ousa "querer ser gente". A forma de silenciar só vai mudando, de quando somos crianças até a vida adulta. Porém, a conduta é a mesma. Ouvi demais "pensa que é gente" quando criança. Claro que sempre vai haver quem justifique como ~brincadeira~, mas é aquela história de falar verdades através de ~brincadeiras~.
Quantas mulheres eu conheço que tem alguma condição neuroatípica. Muitas histórias coincidem, outras se cruzam, mas todas perpassam a nossa invisibilidade social. A gente vê e fala tanto sobre a maneira simplista e desdenhosa com que a sociedade trata mulheres com depressão, ansiedade, pânico, e tantas e tantas outras, mas é como falar ao vento. As "dicas" e "conselhos" maravilhosos e eficientes nunca mudam. "Se anima", "não se deixa ficar pra baixo", "levanta o astral", "deixa isso pra lá", "supera isso logo", blablabla. Foda-se o que vc sofreu ou o que vc passa por conta disso. A mensagem é sempre a mesma: se vira. E, se possível, esconde essa doença, porque ninguém quer falar sobre seu problema ou sequer ter alguém próximo assim. Pega mal. "Deixa de ser um problema pros outros", "egoista", "vadia", "sem vergonha", "exagerada", "preguiçosa", etc etc etc.
Ser sincera é um pecado, porque ninguém tá afim de ouvir verdades. Verdades são inconvenientes. Mulher boa é mulher calada e submissa. De preferência, com um sorriso no rosto.
Viver é dificíl. O mundo é hostil e, se não jogarmos o jogo deles, melhor apertar o reset.
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